25 dezembro 2004

o grande problema é esse:

saber se aquilo que você chama a espécie tem caminhado para a frente ou se, conforme pensava Klages, parece-me, tomou em dado momento o caminho errado.

"Não temos nos saído muito mal" - pode ser um argumento.

Que ponto de comparação temos para pensar que temos nos saído bem? Por que tivemos que inventar o Éden, de viver sob a nostalgia do paraíso perdido, de fabricar utopias, de nos propormos um futuro? Se uma lombriga pudesse pensar, pensaria que a sua vida não tinha andado assim tão mal. O homem agarra-se à ciência como se fosse aquilo a que chamam uma tábua de salvação. A razão segrega através da linguagem um arquitetura satisfatória, como a preciosa e rítmica composição dos quadros renascentistas, e nos põe no centro. Apesar de toda a sua curiosidade e da sua insatisfação, a ciência, ou seja, a razão, começa por nos tranquilizar. "Você está aqui, neste quarto, com seu computador, diante dessa luminária. Não se assuste, vai tudo muito bem. Agora, vejamos: qual será a natureza desse fenômeno luminoso? Você já sabe o que é urânio enriquecido? Você gosta dos isótopos, sabia que já transformamos o chumbo em ouro?" Tudo muito incitante, muito vertiginoso, mas sempre do ângulo da cadeira sobre a qual estamos comodamente sentados.

A noite chega para todos nós. Eu talvez não saiba bem o que é a noite, o tempo e o céu; mas estão aí, fora de mim, são coisas que me acontecem, não adianta fazer nada.