E eu sou a minha história. Dentro dela, outras. E se não escrever com auto-consciência, minhas palavras não vão me servir, não terei lugar nessa história nem na existência. E se é o pau que faz história, eu também tenho o meu. Sacanagem, saca? E se o pau é uma coisa em si e a outra entidade (que eu e todas as mulheres temos e que até bem pouco tempo - e ainda acontece nos dias atuais - não se olhava, não se tocava, não se nomeava, que devia ser conservado tão impoluto que quase deixava de ser nosso) é uma entidade de si, a masturbação é, então, uma coisa para si. E se nem toda masturbação termina em orgasmo, fica interessante o pensamento de que vivo comigo mesma um casamento clássico. Mas não quero luxo nem lixo. No fim dessa conta, é gostoso transar com meu corpo numa boa.
E certa vez eu tive meu primeiro beijo com uma garota ou deveria dizer que ela certa vez teve o primeiro beijo comigo. Foi quando estávamos em quatro garotas, sentadas uma ao lado da outra, no condomínio onde ela morava. A ordem era Simone, ela, Carla e eu. Ela tinha 13 e eu 15. E no meio de uma conversa entre as quatro, ela me chama pra contar qualquer coisa no ouvido. Carla jogou o corpo para frente para que ela e eu pudéssemos nos aproximar. E ela me disse “eu vou beijar você” e recuou lentamente a cabeça para trás, rosto colado ao meu, deslizando a boca do pé do meu ouvido até a minha boca. E tudo em mim parou. Simone e Carla falando em garotos e ela ali, entrando na minha história. Acho que mil expressões passaram por mim. Segundos em que o mundo parou para que eu sentisse aquela língua na minha boca. As duas sem jeito para o beijo e ninguém podia perceber. Tive vontade de abraçá-la. E o restante da noite se passou sem eu sequer imaginar o que elas falavam. Deviam falar ainda nos garotos. Eu só fazia “é”, “hum rum”. Eu havia tido meu primeiro beijo com uma garota e achei que nunca mais conseguiria sair daquele torpor. E me sentia tão mais velha do que ela. Quase uma criminosa por tê-la beijado de volta. Mas ela era tão adolescente quanto eu. Duas noites após aquela, eu não suportei. Inventei uma desculpa para as outras garotas, peguei a mão dela e a levei para as escadas do prédio. Parei logo no primeiro andar e eu a beijei. Com um desejo infinito de vencer todos os sentidos. Ainda tenho uma carta com um cacho dos cabelos dourados dela.
É. Hum rum.
E tem noites em que sinto a vida sem pressa de acontecer.